Ibraim Gustavo
Ibraim Gustavo

Jornalista, pós-graduado em Marketing, MBA em Comunicação e Mídia, e MBA em Empreendedorismo e Inovação. Empreendedor, é sócio-fundador da Freestory – A primeira plataforma do Brasil de autodescrição com storytelling, IA e IoT. Com formação em Profissões do Futuro (O Futuro das Coisas) e no Programa de Capacitação da Nova Economia (Startse). É também músico, escritor, roteirista e storyteller.

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Serra Negra Para os Serranos: Nata da Serra - Autoral e orgânico no seio da terra

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Serra Negra Para os Serranos: Nata da Serra - Autoral e orgânico no seio da terra
Vacas alimentadas a pasto são um dos principais diferenciais que impactam positivamente no resultado dos produtos orgânicos da Nata da Serra | Nata da Serra / Divulgação
Serra Negra Para os Serranos: Nata da Serra - Autoral e orgânico no seio da terra
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Serra Negra Para os Serranos: Nata da Serra - Autoral e orgânico no seio da terra
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Por: Ibraim Gustavo Santos


As tardes outonais costumam trazer um brilho diferente do sol. O dourado melancólico apregoa que o frio está chegando, e que, em breve, a folhagem verde cederá lugar ao marrom adormecido, fazendo hibernar também muitas espécies da natureza, dentre elas variedades de plantas e árvores, que retornarão com seu esplendor alguns meses depois, no aromático desabrochar da primavera.

O cenário caberia perfeitamente bem em qualquer Monet, servindo de inspiração para um café da tarde em família ou entre amigos, em um rancho de madeira disposto sobre um lago onde patos e marrecos dão o ar da graça, e pássaros silvestres vão e vêm, cantarolando sua saudade do ninho maternal.

Mas no sul do Bairro da Serra há um endereço em que a estação tem seus impactos reduzidos, mesmo na ausência de chuva, que prejudica inúmeras plantações. Conforme o visitante avança pela estrada de terra, penetrando nos rincões da fazenda, ainda que desatento, ele poderá perceber que durante todo o trajeto está cercado por pequenos arbustos verdes, rentes ao chão. A mesma tonalidade que se tem em plena estação das flores. E todo esse verdejar esparramado pelo chão não é simplesmente mato. É comida. Apesar de não ser necessariamente destinada ao consumo humano: “irrigamos nossas pastagens, porque o nosso gado basicamente come pasto ao longo do ano todo, sendo gado manejado a pasto. A diferença na qualidade do leite também está muito relacionada à alimentação do animal. Só quero abrir um parênteses aqui, porque hoje as pessoas estão humanizando os animais, numa realidade que vem acontecendo. O público acredita que uma vaca colocada dentro de um galpão com ar-condicionado está vivendo melhor do que uma solta ao sabor do tempo. Isso é um verdadeiro engano, pois a vaca gosta de viver no campo, enfrentando as mudanças do clima. Se chover, ela vai tomar chuva, sem problema algum; se esfriar, tudo bem também, pois ela está preparada para isso, é um animal que está preparado para essas intempéries. É importante deixar o animal viver aquilo que ele está acostumado na natureza, a fim de produzir um produto de qualidade superior”, afirma o produtor rural e proprietário da Fazenda Sula, em Serra Negra, Ricardo Schiavinato, que garante que esse tipo de tratamento com os animais é um dos principais motivos que fazem o leite produzido pela Nata da Serra ter uma qualidade superior em relação aos concorrentes industrializados do mercado.

Mas quem vê o sucesso da fazenda, não faz ideia dos caminhos e da distância percorridos pelo proprietário do local para, hoje, colher os frutos. E, claro, mais uma vez, essa história remonta a décadas do passado: ”Meu bisavô é imigrante italiano, e minha avó já é serrana. Mas ela saiu de Serra Negra e mudou-se para Valinhos com a família, onde nasceu meu pai, que fez faculdade de odontologia e atuou como dentista, fazendo toda a vida dele em sua cidade natal. Nós somos quatro filhos, uma mulher e três homens, e meu pai acreditava que eu seria aquele que seguiria a mesma carreira de dentista. Contudo, fui fazer Agronomia, e em 1988, meu pai, que sempre teve uma ligação muito forte com Serra Negra, acabou comprando esse pedaço de terra que, naquela época, estava totalmente abandonado. Não havia árvores na propriedade, ela estava completamente desmatada. Quando me formo, em 1990, venho para cá e começo a pôr em prática o trabalho que aprendi na faculdade, porém na parte de hortaliças. Mais tarde, em 1992, até mesmo por uma questão de aptidão particular da propriedade, além da questão econômica e de fluxo de caixa, criei o laticínio e comecei a tirar leite. Essa é uma atividade que está sempre fazendo o dinheiro girar, uma atividade ininterrupta, diferentemente do trabalho anual, como o plantio de milho, ou de café, em que o produtor vende toda a produção de uma só vez. Nessa época, porém, nem de perto eu pensava em agricultura orgânica. Eu primeiro vendia leite, depois comecei a manipular o produto dentro da propriedade, e trabalhávamos apenas com o famoso leite “barriga mole”, aquele de saquinho - isso foi a partir de 1994. Comecei a perceber, então, que precisava agregar valor ao meu produto, e parti para a produção de queijo, queijo fresco, ricota, manteiga, requeijão e para a linha de iogurtes. Foi quando passei a prestar atenção que, pelo tamanho que estávamos alcançando, era necessário fazer algo diferente”.

É certo que quando o ingrediente principal daquilo que alguém faz é a paixão, o resultado provavelmente será mais bem-sucedido. Ao menos para quem trabalha e vê a realização do seu esforço sendo convertido em algo benéfico para a sociedade. Entretanto, engana-se quem pensa que tudo precisa começar pela paixão. Grandes empreendimentos surgiram primeiro da necessidade dos indivíduos, e o amor pela causa, antes coadjuvante, veio de mansinho para ocupar o protagonismo do negócio. Foi assim também com Ricardo: “E eu gosto muito de falar sobre como foi meu processo de mudança para o orgânico. Naquela época, eu não ingressei na agricultura orgânica porque acreditava nisso, até porque, lá pelos idos de 1995 ou 1996, e também pela minha própria formação na faculdade, a agricultura orgânica era um negócio impensado, as pessoas sequer falavam nisso. Dentro da universidade, brincávamos dizendo que quem falava desse assunto ‘era o pessoal mais alternativo’. Mas fui levado, por uma questão econômica do trabalho, a conhecer outros produtores. E sobretudo, teve uma situação muito interessante que aconteceu nessa mesma época: eu tinha plantações de tomate, morango e outros frutos, e eu estava com a minha família aqui, recebendo meus pais na propriedade, que resolverem ir até a plantação para pegar tomate e morango para comer diretamente no pé, que, diga-se, é a coisa mais gostosa do mundo. E o que aconteceu foi que eu não deixei que eles pegassem. Ao que ambos me questionaram o motivo da proibição, e eu respondi que eles simplesmente não podiam comer porque eu havia aplicado um produto químico na plantação e que, por conta disso, não poderia ser consumido naquele momento. Devemos nos lembrar que meu pai é dentista, portanto, ele não tem conhecimento de produção agrícola, mas ele me fez um questionamento que, posteriormente, ficou martelando em minha cabeça: ‘Então você não acredita no seu próprio produto? Quer dizer, você vende a outras pessoas, mas não come o seu próprio produto?’, emendando em uma analogia que foi muito interessante, me pedindo para imaginar sendo um engenheiro civil que construiu a própria casa mas não tem coragem de entrar nela porque a construção não foi bem feita e poderia cair. Aquilo me marcou profundamente, e me moveu no sentido de buscar alternativas para a propriedade. Foi assim que me deparei com a agricultura orgânica, muito mais para tentar resolver problemas econômicos da propriedade, e ter um produto com valor agregado maior. Preciso confessar que não entrei nesse ramo pela ideologia ou pela filosofia do orgânico. Todavia - e isso é muito legal da minha história - depois eu me redescobri como profissional e comecei a entender aquilo que antes não compreendia, até mesmo dentro da academia, pois até estávamos falar sobre isso, mas o enfoque que era dado não era o correto, os professores não estavam preocupados com a temática e, quando falavam sobre agricultura orgânica, nós, os alunos, também não nos preocupávamos em escutar aquilo. Somente quando migrei para o orgânico é que passei a entender os processos da natureza - que são os mesmos que ocorrem numa plantação comercial convencional e na criação de um animal - e como a natureza funciona e como ela nos auxilia em todos os processos produtivos”.

Da sua família para toda a sociedade, Ricardo Schiavinato compreendeu que precisava alcançar mais pessoas e oferecer ao público mais qualidade e mais segurança, preocupando-se, inclusive, com aqueles que não consomem o seu produto. E isso, por uma questão de responsabilidade social: ”Existem situações básicas que o produtor orgânico precisa ter na sua propriedade, como os quebra-ventos, pois o vento é um problema seríssimo para as plantas, em geral. Então, faz-se essas barreiras físicas, chamadas de quebra-vento, para evitar a deriva de agrotóxicos dos vizinhos, além da preservação da mata ciliar, introdução de árvores nos sistemas produtivos, pensando no que elas podem trazer de benefício para a os processos. Por exemplo, a Margaridão, também conhecida como Flor de Mel, é encontrada em qualquer beira de estrada aqui em nossa região, e é muito interessante para se ter na propriedade, já que ela é um atrativo de insetos benéficos, como a joaninha, que se alimenta de pulgões e de outros insetos prejudiciais à plantação, e que se abriga nessa planta. Além disso, há outras recomendações elementares para quem quer ingressar na agricultura orgânica e ter acesso a esse mercado diferenciado, como uma profunda preocupação com a preservação e a qualidade da água, conservação de solo e eliminação do uso de venenos. Ao começar a fazer esse trabalho, a propriedade passou também por um processo de melhoria nas suas contas, na questão financeira, mas uma melhoria significativa como sistema de produção e de sustentabilidade. Atualmente, a Fazenda Sula cumpre todos os requisitos legais, sendo ambientalmente correta, com manutenção das matas ciliares e outorga de água, por exemplo, entre outros fatores, mas mais que isso, temos como preocupação ir além daquilo que está disposto na legislação. Fazendo todo esse trabalho de preservação e de investimentos na parte ambiental, ao longo do tempo, alcançamos melhores índices econômicos, produtivos, zootécnicos e de produtividade na Nata da Serra”.

O engenheiro agrônomo afirma que a mudança gera impactos, sobretudo financeiros, com um custo-benefício melhor para quem trabalha com orgânicos, até mesmo porque o jogo está mudando: ”Para ter acesso ao mercado, foi necessário obter a certificação de produto orgânico. Esse processo envolve uma fase de conversão, que pode ser demorada e levar até dois anos, sendo necessário implementar as práticas orgânicas, mas comercializar como um produto convencional. Essa transição inclui a descontaminação do solo e outros cuidados necessários. O que atualmente podemos perceber é que quem não seguir os padrões de sustentabilidade ambiental, vai ficar de fora do mercado, e isso, para mim, é muito claro. O jogo está mudando, pois existe uma percepção do mercado, que está muito exigente em relação a isso, e em segundo lugar a percepção do próprio público consumidor, que está optando por adquirir produtos alimentícios de maior qualidade, como café, iogurte, entre outros. E é preciso que se entenda que implementar processos de sustentabilidade e preservação favorecem a produção, e isso não só para os produtos orgânicos. Um exemplo disso muito latente aqui em nossa região é o café. No passado, os cafeicultores não tinham o costume de adubar suas plantações com insumos orgânicos, como camas de frango, de bovinos e suínos, e esterco de galinha, dando preferência a adubos químicos, até porque é muito mais fácil, um trabalho bem menos pesaroso. No entanto, hoje, o cafeicultor está percebendo que a utilização de adubos orgânicos enriquece a sua produção, pois ele é carregado com uma quantidade e uma diversidade maiores de nutrientes, interferindo no terroir da lavoura e afetando positivamente o resultado final do café e do paladar do consumidor. Outra prática importante para otimizar a produção de café, e eu já falei disso anteriormente, é a implementação de quebra-ventos nas plantações. Temos pouco café plantado na Fazenda Sula, mas eu falo dele porque o grão tem uma ligação histórica com nossa cidade e é um bom exemplo para darmos. O quebra-vento é algo muito simples, uma técnica que pode envolver o plantio de capim cameron, ou então o que muito usual em nossa região, que são as bananeiras, ou ainda árvores, que demoram mais tempo para crescer, mas têm excelente resultado também. A vantagem de usar esse recurso é que ele, literalmente, quebra os ventos, protegendo a  plantação. Muitas ocorrências de ferimentos nas plantas ocorrem por conta da passagem de ventos muito fortes que fazem com que uma folha entre em choque com outra, ou com galhos e, assim, oportunizam a incidência de doenças nas plantas. Além disso, os quebra-ventos auxiliam na retenção de água no solo, garantindo que as plantas tenham acesso a recursos hídricos mesmo em períodos de estiagem, bem como servindo como refúgio para insetos benéficos, que contribuem para o equilíbrio do ecossistema da plantação. Essas pequenas ações e práticas de manejo sustentável resultam em melhorias na plantação, conferindo um diferencial competitivo para o produtor, mesmo que ele não tenha o selo orgânico. Eu, particularmente, não consigo mais enxergar saída de sobrevivência para um produtor rural que não esteja disposto a adotar práticas sustentáveis. Ou ele será banido do mercado por questões econômicas, ou por qualidade e preferência dos consumidores, e essa é uma realidade que se torna cada vez mais evidente”.

Ainda que timidamente, a sociedade - brasileira, inclusive - está em busca de mais saúde, qualidade de vida e longevidade por meio da alimentação. E isso passa pelo consumo de melhores produtos, sem aditivos ou com redução deles, a despeito de serem sensivelmente mais caros nas prateleiras dos supermercados, dos armazéns e dos empórios. E o alimento orgânico é um dos líderes desse movimento: “Esse é um caminho sem volta. Lógico que há muita coisa em jogo, por exemplo, o nosso país e o nosso povo brasileiro são muito novos. Ainda vivemos em um país de grandes desigualdades, e temos graves problemas relacionados à renda do trabalhador. Por outro lado, precisamos destacar alguns pontos: A Embrapa é parceira da propriedade desde 2005, somando 20 anos que essa empresa pública desenvolve tecnologia de produção e faz pesquisa dentro da minha propriedade, principalmente na produção de leite, mas também de hortaliças. Estou contando isso para explicar ao público que quando ele compra o leite ele enxerga apenas o litro de leite, e faz os cálculos do que é mais viável mediante à pesquisa de prateleira de supermercado. O que ainda não está claro ao comprador são as propriedades e os nutrientes que um litro de leite possui e o outro não. O nosso esforço junto à Embrapa é de alterar as informações disponíveis na tabela nutricional do Brasil, no formato que já acontece em alguns países, que revelam o que, de fato, um produto alimentício tem. A título de exemplo, o público consumidor pode imaginar que as relações de gordura do leite orgânico com o leite convencional giram em torno de 20% ou 30%. Porém, a diferença é muito maior, é uma relação que alcança 3 vezes mais. Outro exemplo está relacionado ao ácido linoleico conjugado, um antioxidante comumente chamado de CLA. Existem inúmeros estudos que mostram a ação dessa substância na redução de risco de cânceres de intestino e do reto. Uma pesquisa feita aqui na Fazenda Sula apontou que a diferença entre o CLA do leite convencional e do leite orgânico é de 150%. Há ainda no âmbito de mais qualidade do nosso leite, questões relacionadas às gorduras, ao ômega 3, ao ômega 6, entre muitos outros indicadores”.

Além do leite, Schiavinatto defende que outros produtos da sua propriedade são distintos das marcas tradicionais dos supermercados, como é o caso da manteiga: “O processo de produção da nossa manteiga é bastante simples: desnatamos o leite e o colocamos na batedeira. É só isso. Naturalmente a manteiga já sai amarela da batedeira, diferentemente das marcas convencionais, que utilizam aditivos como corantes para dar cor ao produto. Outra pesquisa feita pela Embrapa recentemente, analisando mais de 4 mil propriedades agrícolas, mostrou que o leite com maior percentual de betacaroteno, que justamente fornece essa coloração amarelada e que é importante para a saúde humana, foi no leite da Nata da Serra”.

Ricardo sustenta que não se trata somente de sabor e saúde, o que, por si só, já seria suficiente para que mais pessoas se convencessem da necessidade de fazer melhores opções. Ao contrário, os impactos ambientais e sociais são ainda mais importantes, já que, neste caso, afetam não somente a vida do indivíduo, mas de todos ao seu redor: “Existe um custo que está embutido no produto sustentável que o consumidor ainda tem dificuldade para compreender, que é um trabalho de melhoria para a sociedade como um todo. Um produtor de leite que não se preocupa com as questões adjacentes ao seu negócio, não terá os mesmos custos que um produtor orgânico. Quais questões são essas: uso de venenos, ausência de curva de nível para não afetar propriedades vizinhas em caso de chuvas, gerando um problema ambiental enorme, questões trabalhistas e os cuidados para com a saúde de quem está trabalhando no local e de quem está consumindo aquele produto, preservação do meio ambiente, entre outras. Ou seja, não é apenas o trabalho orgânico, que está ainda um nível acima disso, mas uma produção sustentável já tem custos mais elevados e que são repassados ao consumidor. Eu desejo que as pessoas entendam que a produção sustentável está preocupada com matérias que não têm uma aparente conexão direta com a produção, enquanto o vizinho, que geralmente não é sustentável, não dá satisfação a ninguém. Enquanto o consumidor paga um preço mais baixo num produto convencional do mercado, a sociedade como um todo está pagando o custo que aquele produto vai trazer para todos nós, com aumento de doenças, contaminação do meio ambiente, desperdício de água para limpeza, entre outras situações. É bastante comum nos dias de hoje ouvirmos as pessoas dizerem que estamos adoecendo pela boca, ou seja, por aquilo que ingerimos. Temos a impressão de que, no passado, as pessoas envelheciam melhor e de maneira mais saudável. Mas eu acredito que quando esse movimento crescer e se tornar uma onda, as coisas tenderão a facilitar para todos, tanto produtores quanto consumidores”.

Contudo, é muito difícil ser sustentável sozinho. O produtor afirma que é necessária toda uma mudança de mentalidade da população, convergindo para este fim que, sem dúvida, beneficiará a todas as pessoas conjuntamente: ”É válido destacar que a água é um bem escasso. Dito isso, aqui na propriedade utilizamos a irrigação para ter pasto o ano todo para as nossas vacas, e nós achamos por bem instalarmos uma estação meteorológica particular aqui dentro, para justamente reduzir a pegada hídrica na nossa produção, adicionando somente a quantidade necessária de água para cada fim específico. Com tecnologia agregada, essa estação meteorológica indica qual o volume de água que eu devo lançar sobre o pasto. Para se ter uma ideia, em números, depois da instalação da estação, tivemos uma diminuição de mais de 30% de consumo de água aqui na fazenda. E essa água excedente está indo para onde agora que não a utilizamos mais? Para as pessoas. Isso é fazer uma produção responsável e sustentável, com impactos significativos no bolso do produtor que não gasta dinheiro desnecessariamente. São atitudes que precisamos tomar ao longo do tempo”, defende o produtor.

Do mato ao orgânico

O design que utilizava terra, água e muito mato alto era assinado pela maior das arquitetas: a própria natureza, sem intervenção humana, ainda em 1988. Quatro anos mais tarde, em 1992, conheceu-se o embrião daquilo que viria a ser a produção de leite na Fazenda Sula.

Nessa mesma época, o termo “orgânico” tinha os seguintes significados: na biologia: “relativo ou pertencente a um ou mais órgãos, ao organismo de um ser vivo”;  na medicina: “que tem um substrato anatomicamente claro (diz-se de doença ou lesão)”; no direito: “que preside à organização de um governo (diz-se de uma lei constitucional ou essencial)”. E era apenas isso.

De uns anos para cá, a palavra ganhou novos contornos, podendo significar mais saúde e mais qualidade. De acordo com o Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa): “A produção orgânica é um sistema de integração de práticas culturais, biológicas e mecânicas que promovem a ciclagem de recursos, o equilíbrio ecológico e conservam a biodiversidade. Assim, trata-se de um sistema que prioriza técnicas ecológicas em busca de menores impactos ambientais, sociais e na saúde ao eliminar o uso de fertilizantes e pesticidas sintéticos, antibióticos e hormônios, sementes e raças geneticamente modificadas, conservantes, aditivos e irradiação”.

O termo, o conceito e os produtos orgânicos vão ganhando cada vez mais espaço nas prateleiras dos supermercados e na preferência dos consumidores, especialmente nos últimos anos. Em se tratando de Brasil, a Nata da Serra foi vanguardista em relação a este tipo de produção alimentar, pois já em 1997 foram dados os primeiros passos nessa trilha. Dúvida, certeza, medo, coragem? Todos esses sentimentos poderiam entrar em campo quando um assunto tão inovador surgiu na mente de Ricardo Schiavinato: “Eu conheço um pesquisador da Embrapa que costumava dizer que a melhor tecnologia para um produtor é a dor de cotovelo. Comigo foi exatamente assim, porque eu bati o martelo da minha mudança para a produção orgânica quando fui visitar outros produtores, no Brasil e no exterior, que já tinham produção de hortaliças orgânicas, já que o leite era um negócio ainda incipiente. Uma das propriedades que visitei para minha pesquisa permaneci acompanhando, semanalmente, o trabalho de um produtor durante um ano, observando os lotes de tomate que ele plantava e o manejo dele pensando como ele fazia aquilo sem usar veneno. E foi impactante para mim ver que ele tinha sucesso, vendendo tudo o que ele produzia de forma limpa, em um mercado completamente diferente do que eu atuava até então, repleto de oscilações típicas do mercado. Mas volto a frisar que, no primeiro momento, eu bati o martelo muito mais por uma questão econômica. Somente depois, quando começo a fazer esse trabalho de agricultura orgânica dentro da propriedade é que eu mudo como pessoa, como agrônomo e como ser humano. Foi isso que aconteceu comigo”, testemunha Ricardo.

O trabalho autoral e os produtos artesanais

A pequenina Katwoude é uma vila rural holandesa que abriga algumas propriedades onde é possível avistar vacas e ovelhas pastando nos campinhos banhados pelas águas do estreito de Monnickendammergat, entre Marken e Volendam. A vista do mar acima dos olhos, o vento gelado cortando o rosto e o tranquilizante som dos moinhos de vento impressionam o turista. Porém, é com outro sentido que sua alma é captada para a riqueza que aquele vilarejo cultiva: a fazenda de Jacob Hoeve produz e vende alguns dos melhores queijos do planeta, preparados a partir dos leites de vaca e de ovelha.

Gouda, curado, alho negro, lavanda, coco e o mais novo queijo orgânico de Kalamata (azeitona grega) com tomate são os destaques da produção. Cada um deles tem uma média de preço de €14,95 (R$97,00 na cotação de julho de 2025), podendo chegar a impressionantes €89,95 (ou R$583,71), como é o caso do Gouda Jovem, também orgânico, e medalha de prata no World Cheese Awards 2022-2023. Na visita guiada ao local, é possível provar alguns deles, e impossível não trazê-los para casa.

O desembarque no Aeroporto Internacional de Cumbica, em Guarulhos-SP, porém, pode surpreender o viajante, com o alto-falante anunciando que quem chega ao Brasil com produtos alimentícios trazidos de fora do país precisa passar pela alfândega para fiscalização. Além de queijos, chocolates, cafés, chás e outros itens podem ser retidos, caso o comprador não apresente a nota fiscal, ou a entrada do produto seja proibida no país. Casos clássicos vistos dezenas de vezes nos programas de TV.

Se há algumas décadas era verdade dizer que os bons produtos brasileiros eram exportados, e só ficava por aqui “o resto”, atualmente essa afirmação já não faz sentido algum. Especialmente no que diz respeito aos produtos artesanais fabricados em Serra Negra, como o café especial, o vinho, a cachaça, o queijo e demais derivados do leite. E isso só foi possível graças à Instrução Normativa nº. 30 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) de 7 de agosto de 2013, que trata dos queijos artesanais tradicionalmente elaborados a partir de leite cru. Essa portaria permite que pequenos produtores assinem queijos artesanais e autorais, competindo com a grande indústria, e muitas vezes apresentando produtos de qualidade superior.

”Essa foi uma questão fundamental que resolveu o problema dos produtores artesanais, principalmente os que trabalham com produtos de origem animal, e que antigamente precisavam seguir uma legislação sanitária muito mais parecida com a norte-americana, voltada para beneficiar as grandes indústrias, do que com a europeia, onde o pequeno produtor é muito valorizado. É muito  ilustrativo o que ocorre, porque ao comprar um queijo francês, que é feito com leite cru de um pequeno produtor, e que sofreu o ataque de fungos e por conta disso é um produto premiado, é extremamente valorizado no Brasil. Enquanto isso, nós não podíamos fazer o mesmo queijo porque a nossa legislação não permitia. A Instrução Normativa nº. 30 foi uma verdadeira abertura de portas, fundamental para o pequeno produtor, que atua dentro das categorias, seguindo todas as normas e os limites de produção. O que essa legislação fez, juntamente com o SISP artesanal, no estado de São Paulo, foi possibilitar ao produtor rural ter uma estrutura mais enxuta que a grande indústria, mas com muita qualidade, resultando em um produto diferenciado. Isso vai ao encontro daquilo que falávamos anteriormente, de que o público está querendo produtos de maior qualidade, e o artesanal entrega isso. Especialmente aqui no nosso país, que tem uma variedade de queijos de qualidade muito limitada, resumindo-se à parmesão, gouda, camembert e gorgonzola. Com essa nova possibilidade, atualmente nós temos muitos pequenos produtores fazendo queijos autorais de excelente qualidade, como aqui na Nata da Serra. Nós temos três queijos autorais. Um deles foi batizado de “Serra Negra”, um produto que o cliente não encontra em nenhum outro lugar, porque ele é feito com o nosso leite, e foi desenvolvido pelo nosso mestre queijeiro”.

Se o consumidor deseja mais qualidade nos queijos que ele próprio consome e oferece à sua família, não precisa mais cortar a estrada, passar três horas esperando para embarcar, atravessar o oceano em um voo de 12 horas e visitar Katwoude. Apesar de ser um passeio extremamente recomendado e transformador, se a intenção é apenas comprar queijos de qualidade, basta ele dirigir por 14 minutos pelos 10 quilômetros da Rota do Café e chegar à Fazenda Sula, no Bairro da Serra: “Ultimamente, os queijos brasileiros têm recebido prêmios internacionais, não ficando atrás de nenhum produto internacionalmente reconhecido, como os queijos franceses, holandeses, suíços ou italianos. E esse processo de melhora tem a ver com a abertura proporcionada pela mudança da legislação, que permite e incentiva aos produtores serem inventivos e criarem produtos autorais. Para conhecer esses produtos, é possível visitar a propriedade, que está localizada na Rota Turística do Café, a antiga Rota do Bairro da Serra, um trabalho iniciado há mais de 20 anos por mim e outros produtores, como Nelson Bruni, Zaira Antunes Franchi, João Salzani e Nestor Marchi”.

E se os produtores locais saem do Brasil para fazer benchmark, o inverso também é verdadeiro: “Dois anos atrás, eu fui à Nova Zelândia, país que é um verdadeiro case de sucesso na produção de leite e a pasto, para conhecer os métodos de produção utilizados lá. Inclusive, importei para o rebanho da Nata da Serra a genética da Nova Zelândia. Algum tempo depois, eu recebi a visita de um grupo neozelandês para conhecer a produção de leite da Fazenda Sula, e aproveitei para apresentar a eles os queijos que fabricamos aqui, ao que aquelas pessoas ficaram abismadas ao provarem os produtos feitos aqui, maravilhados com os queijos, especialmente os autorais. Esse tipo de testemunho nos faz compreender que o trabalho que realizamos é de altíssima qualidade, ainda que para um pequeno produtor, de 1.500 litros de leite por dia. E esse é o meu trabalho, mesmo com essa limitação, já que não conseguiremos extrair 50 mil litros de leite por dia como as grandes empresas. Entretanto, o que queremos é que as pessoas tenham prazer de consumir um produto de qualidade”.

Como testemunho pessoal, mesmo já tendo provado alguns dos mais reconhecidos queijos do mundo, é emocionante poder afirmar que entre eles está o Queijo Itálico Nata da Serra, um produto 100% autoral de Serra Negra: ”Fico muito feliz de você falar que gosta do Itálico, pois realmente é um dos queijos que tivemos maior sucesso, o único da nossa linha produzido a partir do leite cru da Nata da Serra. E há algo interessante na sua elaboração, porque quando ele foi feito, acreditávamos que o produto tinha dado errado, pois o queijo estufou, e num primeiro momento, achamos que era resultado de alguma contaminação. Posteriormente, descobrimos que o leite utilizado como base é rico da bactéria propiônica, que produz um gás adocicado e que permitiu esse estufamento natural, diferentemente do que acontece com queijo gouda, por exemplo, que a indústria injeta essa bactéria para provocar as bolhas de ar. A bactéria propiônica está presente nas nossas pastagens, é um perfil do solo da Fazenda Sula, uma característica específica do local, proporcionando um paladar diferente ao queijo”.

O rancho onde a entrevista foi gravada já foi palco de vários encontros, chegando a receber mais de 3 mil pessoas durante as férias de julho de 2006 ou 2007 (Ricardo não se lembra bem). Durante a conversa, o empresário revelou que a ideia de reabrir o espaço para visitantes comuns estava sendo avaliada. Para sorte de serranos e turistas, três semanas depois a fazenda abria a porteira para receber dezenas de pessoas durante o primeiro dos cafés da manhã oferecidos no local, regados a produtos orgânicos da Nata da Serra: “Estamos realmente pensando. Esse meu retorno para a Rota do Café tem muito a ver com isso. Mas antes, é necessário estruturar melhor a propriedade, e organizar os passeios. No passado, praticamente todos os hotéis e pousadas de Serra Negra traziam seus hóspedes para visitar a fazenda, vindos no antigo ônibus amarelo do Nestor Marchi, os moradores mais antigos hão de se lembrar do Yellow Bus, que percorria as ruas da cidade chamando a atenção, saindo da praça central com os turistas, e fazia a Rota do Bairro da Serra - hoje, Rota do Café. Era um trabalho muito legal, mas com o passar do tempo, mudamos nosso foco. E com a entrada da Embrapa como parceira, outras demandas surgiram, como treinamentos para técnicos e produtores, uma atividade que me permite ter contato com produtores de todo o país. Já visitei propriedades rurais do Rio Grande do Sul ao Amazonas, e muitas delas mudaram, evoluíram e passaram a ter renda devido ao Turismo Rural, que é uma atividade extremamente rentável para a propriedade agrícola, contanto que ela tenha o que oferecer, logicamente. A propriedade precisa se estruturar, já que se trata de outro trabalho, muito diferente da atividade no campo. Mas eu aproveito o ensejo para incentivar a todos os produtores que têm essa capacidade para enveredar por esse caminho, haja vista o que está acontecendo com as propriedades aqui da Rota do Café, sempre cheias de turistas que desejam ver os locais e conhecer as experiências. E o nosso trabalho tem sido de indicar ao visitante outros locais daqui da Rota, com um empreendedor ajudando o outro, sugerindo que o turista se dirija às demais propriedades para conhecer também”.

Os produtos Nata da Serra estiveram presentes também na edição de 2025 do Festival do Café e Riquezas da Terra, oportunidade em que muitas pessoas conheceram os orgânicos da Fazenda Sula: “Esse festival foi uma doce surpresa. Primeiro, porque a estrutura, a organização e a divulgação foram muito positivas. E, depois, o que aconteceu durante o festival, com aquele público incrível formado por pessoas ávidas por querer conhecer os produtos e experimentar. Recebemos muitos elogios, vindos de quem nem sequer sabiam da nossa existência, especialmente de moradores de Serra Negra. Hoje mesmo, por sinal, encontrei uma pessoa que é muito minha amiga e que me revelou não saber que produzimos queijos artesanais em nossa fazenda, acreditando que nosso trabalho se limitava aos iogurtes. E olhe que estamos fazendo isso já há quatro anos. Portanto, o festival foi magnífico e muito importante para todos os produtores rurais serranos, especialmente porque tivemos a oportunidade de expor e vender nossos produtos lá. Na verdade, esse tipo de evento precisa acontecer mais vezes, para justamente expor as marcas dos produtores de Serra Negra, a fim de que tanto visitantes quanto moradores conheçam”.

Alguns dias depois do Festival, Ricardo foi até à sede da prefeitura para conversar com o  prefeito a fim de parabenizá-lo pela organização do evento, e tratar de novas possibilidades de realização de outros festivais semelhantes: “Eu tive a oportunidade de falar sobre o festival com o prefeito em uma reunião, e aproveitei para, de certa forma, pleitear que nas próximas edições o festival não aconteça durante um final de semana apenas, podendo se estender por até dois. Até mesmo porque, o contingente de visitantes foi bastante alto, e esse número pode ser ainda mais ampliado se aumentarmos os dias da festa. Outra solicitação que fiz a ele é que o município tenha mais uma data durante o ano para realizar um evento como o Festival do Café e Riquezas da Terra, incrementando, de preferência, o calendário cultural do segundo semestre, o que contribuiria muito com os produtores serranos”.

Sextas orgânicas

O café está passando pelo coador e o cheiro suave que exala da fumaça sobe pelo ar até desaparecer antes de alcançar o teto da cozinha. Enquanto espera as últimas gotas caírem no copo, a campainha toca. É sexta-feira, e o pedido da semana chegou. As sextas (cestas) orgânicas são enviadas pela Nata da Serra até às casas dos serranos que escolhem os produtos ao longo da semana. Queijos e iogurtes orgânicos são os campeões de venda. Mas além deles, hortaliças e legumes também são adquiridos, e o convite é esse, para que justamente os serranos passem a consumir os produtos locais: “Estamos fazendo o trabalho de entrega de cestas orgânicas toda sexta-feira aqui em Serra Negra já faz algum tempo, cerca de quatro anos, e é uma atividade que tem aumentado a procura. E no intuito de proporcionar ao público que ele conheça todos os produtos, reduzimos os preços a basicamente o valor que vendemos no atacado. Essa é uma estratégia interessante porque ainda enfrentamos dificuldade para vender nossos produtos nos supermercados locais. E compreendo que não se trata de não ter interesse nos produtos orgânicos, mas a dificuldade de revendê-los para o consumidor final, que ainda não está totalmente interessado ou ainda não entende o que é o produto. Inclusive, agradecemos a você, Ibraim, porque essa série está abrindo uma porta espetacular para podermos mostrar todo o universo orgânico. De Serra Negra, há quem venha aqui na fazenda comprar nossos produtos, mas eu diria, sem medo de errar, que as vendas para serranos e moradores da região é menos de 5% daquilo que produzimos. Então, basicamente, vendemos nossos produtos em Campinas e na Região Metropolitana, e também na capital e na grande São Paulo. Atuamos ainda no Rio de Janeiro, Curitiba e Florianópolis, entretanto, não vendemos para as grandes redes de supermercado ou atacados, sendo produtos exclusivos para públicos que frequentam feiras, empórios e mercados específicos. Em São Paulo,  estamos presentes na Feira da Água Branca, e realizamos um trabalho junto a associações, como o Instituto Baru e o Instituto Chão,  que nos dá a possibilidade de atuar com o comércio justo, o chamado ‘Fair Trade’, que vende para o cliente final com o mesmo preço que eles adquiriram, que nada mais é que o preço de atacado, colaborando para que as lojas desses institutos continuem abertas ao público e funcionando. Essa é uma realidade que tem crescido muito em São Paulo, fruto do trabalho de pessoas que querem mudar o mundo” comenta o produtor, que mostra, na essência, a diferença entre comprar algo dos supermercados tradicionais e de empreendimentos alternativos como esses: “O que é possível comprar no mercado? Na realidade, o cliente vai ao supermercado para comprar somente aquilo que é ofertado na prateleira, e nem sempre é exatamente aquilo que ele está procurando. Portanto, quem busca produtos diferenciados, em variedade, qualidade e sabor, precisa se dirigir a essas lojas, empórios e feiras, onde há uma diversidade maior de produtos alimentícios vindos de produtores que não conseguem acessar o grande varejo”.

A zona rural de Serra Negra é uma das grandes preciosidades do interior paulista. Sítios, fazendas e estradas que, quanto mais perscrutamos por elas, mais no coração do povo serrano adentramos. Seus hábitos, suas receitas, seu modo de viver a vida, sua essência. Tudo se traduz no copo de café - ou de leite orgânico - oferecido ao visitante.

Enquanto a experiência de vida, refletida nas cãs, convence de que o interior é o destino mais apropriado, o viço da juventude impele seu portador a desbravar outras bandas. Isso é completamente compreensível, e não há dolo nessa decente escolha. Contudo, quanto mais nos afastamos do passado, mais distantes ficamos de construir o futuro próspero e glorioso da comunidade. Fica mais difícil avistá-lo, se nossos olhos são treinados a abandonar de vista a própria terra, e focar em outros locais. Aproveitar os momentos de descanso e lazer para garimpar a própria cidade é uma prazerosa tarefa que pode contribuir para mostrar como Serra Negra é uma joia que deve ser ainda mais lapidada.

Os prêmios e as láureas confirmam esse ponto de vista: “Essa questão é muito interessante porque as pessoas precisam entender que o mundo é globalizado. Por exemplo, qualquer pessoa hoje pode hoje trabalhar remotamente em Serra Negra, vivendo numa cidade maravilhosa, espetacular, com qualidade de vida, e prestar serviço para empresas na China, na Índia, na Europa, nos Estados Unidos. Eu mesmo conheço muita gente que faz isso. Por outro lado, e essa é uma preocupação que eu tenho como pessoa, acredito também que a juventude precisa entender que esse trabalho da produção rural é muito digno. Muita gente vê esse tipo de atividade como algo que não traz status. Bem, eu fiz a minha vida toda dentro de uma propriedade agrícola, com as facilidades e as dificuldades de todo serviço, muitas vezes um pouco mais manual que os demais, mas é um trabalho extremamente digno, e eu ainda vivo disso, não tenho outra fonte de renda. A minha vida é isso aqui. Minha torcida é para que o jovem entenda isso, por isso deixo um recado aos jovens. Eu tenho dois filhos, e sei exatamente como é isso, até porque, não sei se eles darão continuidade às atividades da propriedade. Mas isso, pessoalmente para mim, é uma situação em que estou em paz, preciso deixar isso bem claro. Eu mesmo sou filho de dentista e não estudei odontologia, optando por fazer agronomia, que é aquilo que gosto. Sendo assim, não tenho motivos para, em algum momento, obrigar meus filhos a investirem nisso. Mas para quem gosta do campo, minha sugestão é: trabalhe no campo. Porque é uma vida maravilhosa. Eu entendo que quando se é jovem há uma percepção de haver poucas opções em uma cidade pequena como Serra Negra, especialmente de lazer e emprego. Mas vivendo aqui, eu consegui dar oportunidades para meus filhos, por mérito deles também, é claro, mas eles estudaram em universidades fora do Brasil. E depois que saíram daqui para morar no exterior, hoje eles têm uma relação completamente diferente com Serra Negra, valorizando a cidade pelo que ele é e tem a oferecer. Nós realmente vivemos numa cidade abençoada, em uma região espetacular. E, mesmo não sendo uma cidade grande, Serra Negra nos oferece diversas oportunidades de trabalho aqui, ao mesmo tempo em que estamos próximos dos grandes centros, como Campinas e São Paulo. Por fim, este é um lugar que nos dá a possibilidade de ter sucesso profissional e, como nem tudo se trata de dinheiro, sucesso na sua vida também, que é o mais importante”, conclui Ricardo Schiavinato.

Entrar no carro e partir depois de tanto aprendizado é a parte mais difícil dessa série. Voltamos, sim! Para o café da manhã na fazenda. Mas antes, seguimos pelo caminho que nos levará ao último destino da Rota Turística do Café, entre montanhas e vales, na intersecção da Mata Atlântica com o Cerrado, até o Bioparque Serra Negra.

Você pode ouvir essa história, com a participação de Ricardo Schiavinato, além dos próximos episódios da série em:

Edição impressa e no portal online do Jornal O Serrano, nas próximas 6 sextas-feiras;

Na Rádio Serra Negra: FM 104,5 mHz / ou no site da rádio, clicando aqui, sextas-feiras, às 10h (reprise às 20h);

Canal do Spotify aqui

Em livro*: ainda sem data para publicação.

Série Serra Negra Para os Serranos:
Roteiro e apresentação: Ibraim Gustavo Santos 

Realização: Jornal O Serrano e Rádio Serra Negra 

Produção: Freestory 

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